segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

O Sacrifício * Iacyr Anderson Freitas - MG

O Sacrifício
- Conto - 
Iacyr Anderson Freitas - MG
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O SACRIFÍCIO
São os que matam.
Por encomenda
ou acerto de contas.
Também educam
no seu carinho.
No seu carinho
que não tocamos.
O lado quente
da morte.
Edimilson de Almeida Pereira

Esta noite passei da conta. Bebi demais. Minha cabeça ainda não parou de girar. De quando em vez o chão do quarto ameaça sumir, enquanto procuro afastar esta incômoda iminência de vômito. Estou apenas adiando o sacrifício. Terei de me levantar de qualquer jeito, sair em disparada para o banheiro, enfiar o rosto na moldura do vaso e abrir as comportas. Não haverá escapatória. Embora não seja uma novidade, isso me assusta ainda. Esse revés de afogamento. O ar fugindo dos pulmões não por força de uma água externa ao corpo, mas sim por causa de mananciais internos, insuspeitos, vulcões que rebentam pela garganta acima e ganham os esgotos do mundo.
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segunda-feira, 4 de setembro de 2017

A Noite * Franz Kafka - República Tcheca

À Noite


Afundado na noite. Como alguém que às vezes baixa a cabeça para meditar, totalmente afundado na noite. Em torno as pessoas dormem. Uma pequena encenação, um inocente auto-engano de que dormem em casas, em camas firmes, sob o teto sólido, estirados ou encolhidos sobre colchões, em lençóis, sob cobertas, na realidade reuniram como outrora e mais tarde, em região deserta, um acampamento em ar livre, um número incalculável de pessoas, um exército, um povo, sob o céu frio, na terra fria, estendidos onde antes estavam em pé, a testa premida sobre o braço, o rosto voltado para o chão, respirando tranquilamente. E você vigia, é um dos vigias, descobre o mais próximo pela agitação da madeira em brasa no monte de galhos secos ao seu lado. Por quê você vigia? Alguém precisa vigiar, é o que dizem. Alguém precisa estar aí.

(in Narrativas do Espólio)
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Minibio - 

FRANZ KAFKA  

franz kafka nasceu em 3 de julho de 1883 na cidade de Praga, Boêmia (hoje República Tcheca), então pertencente ao Império Austro-Húngaro. Era o filho mais velho de Hermann Kafka, comerciante judeu, e de sua esposa Julie, nascida Löwy. Estudou em sua cidade natal, formando-se em direito em 1906. Trabalhou como advogado, a princípio na companhia particular Assicurazioni Generali e depois no Instituto de Seguros contra Acidentes do Trabalho. Duas vezes noivo da mesma mulher, Felice Bauer, não se casou. Em 1917, aos 34 anos de idade, sofreu a primeira hemoptise de uma tuberculose que iria matá-lo sete anos mais tarde. Alternando temporadas em sanatórios com o trabalho burocrático, nunca deixou de escrever, embora tenha publicado pouco e, já no fim da vida, pedido inutilmente ao amigo Max Brod que queimasse seus escritos. Viveu praticamente a vida inteira em Praga, exceção feita ao período de novembro de 1923 a março de 1924, passado em Berlim, longe da presença esmagadora do pai, que não reconhecia a legitimidade de sua carreira de escritor. A maior parte de sua obra — contos, novelas, romances, cartas e diários, todos escritos em alemão — foi publicada postumamente. Kafka faleceu em um sanatório perto de Viena, Áustria, no dia 3 de junho de 1924, um mês antes de completar 41 anos de idade. Seu corpo foi enterrado no cemitério judaico de Praga. Quase desconhecido em vida, o autor de O processo, Na colônia penal, A metamorfose e outras obras-primas da prosa universal é considerado hoje — ao lado de Proust e Joyce — um dos maiores escritores do século xx. 

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domingo, 3 de setembro de 2017

Ficção Científica * Uilcon Pereira - SP

Ficção Científica
-jornaldepoesia-
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lembrei-me de uma história, e vou contá-la novamente

era uma vez, em Assobradado, no natal de 1987, um doutor chamado Ralf Bateson. ele desejava conhecer os processos mentais, a própria essência da vida espiritual, através de Biutex, infalível computar da nova geração

perguntou-se
- computas que algum dia pensarás como um ser humano?

a máquina começou a trabalhar, analisando os seus métodos e esquemas de raciocínio. finalmente devolveu a resposta numa folha de papel. Ralf Bateson apanhou a solução do enigma e  leu, cuidadosamente datilografadas e cercadas as palavras:
"isso me faz lembrar uma história"

in "A Educação Pelo Fragmento"
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quarta-feira, 5 de abril de 2017

Decálogo do Perfeito Contista * Horácio Quiroga - Uruguai

DECÁLOGO DO PERFEITO CONTISTA


Por Horacio Quiroga 

I - Crê em um mestre - Poe, Maupassant, Kipling, Tchecov - como em Deus.

II - Crê que tua arte é um cume inacessível. Não sonhes alcançá-la. Quando puderes fazê-lo, conseguirás sem ao menos perceber.

III - Resiste o quando puderes à imitação, mas imite se a demanda for demasiado forte. Mais que nenhuma outra coisa, o desenvolvimento da personalidade requer muita paciência.


IV - Tem fé cega não em tua capacidade para o triunfo, mas no ardor com que o desejas. Ama tua arte como à tua namorada, de todo o coração.


V - Não comeces a escrever sem saber desde a primeira linha aonde queres chegar. Em um conto bem-feito, as três primeiras linhas têm quase a mesma importância das três últimas.


VI - Se quiseres expressar com exatidão esta circunstância: "Desde o rio soprava o vento frio", não há na língua humana mais palavras que as apontadas para expressá-la. Uma vez dono de tuas palavras, não te preocupes em observar se apresentam consonância ou dissonância entre si. VII - Não adjetives sem necessidade. Inúteis serão quantos apêndices coloridos aderires a um substantivo fraco. Se encontrares o perfeito, somente ele terá uma cor incomparável. Mas é preciso encontrá-lo. 

VIII - Pega teus personagens pela mão e conduza-os firmemente até o fim, sem ver nada além do caminho que traçastes para eles. Não te distraias vendo o que a eles não importa ver. Não abuses do leitor. Um conto é um romance do qual se retirou as aparas. Tenha isso como uma verdade absoluta, ainda que não o seja. 

IX - Não escrevas sob domínio da emoção. Deixe-a morrer e evoque-a em seguida. Se fores então capaz de revivê-la tal qual a sentiu, terás alcançado na arte a metade do caminho. 

X - Não penses em teus amigos ao escrever, nem na impressão que causará tua história. Escreva como se teu relato não interessasse a mais ninguém senão ao pequeno mundo de teus personagens, dos quais poderias ter sido um. Não há outro modo de dar vida ao conto.


Horacio Silvestre ­Quiroga Forteza (Salto, 31 de dezembro de 1879 — Buenos Aires, 31 de dezembro de 1937) foi um escritor uruguaio famoso por seus contos, que geralmente tratavam de eventos fantásticos e macabros na linha de Edgar Allan Poe e de temas relacionados à selva, sobretudo da região de Misiones, na Argentina, onde Quiroga passou parte da vida.


Sua obra mais famosa são os Cuentos de amor de locura y de muerte (1917; título sem vírgula no original), na qual se encontra o célebre conto A Galinha Degolada.


Em 1937, após ter sido diagnosticado com câncer, Quiroga cometeu suicídio, ingerindo uma dose letal de cianureto.



Fonte: http://mgallo.zip.net/arch2007-04-16_2007-04-30.html#2007_04-21_11_57_47-113757668-0